04/11/2018

[Resenha] O sol na cabeça - Geovani Martins


Sinopse: Em O sol na cabeça, Geovani Martins narra a infância e a adolescência de garotos para quem às angústias e dificuldades inerentes à idade soma-se a violência de crescer no lado menos favorecido da “Cidade partida”, o Rio de Janeiro das primeiras décadas do século XXI. Em “Rolézim”, uma turma de adolescentes vai à praia no verão de 2015, quando a PM fluminense, em nome do combate aos arrastões, fazia marcação cerrada aos meninos de favela que pretendessem chegar às areias da Zona Sul. Em “A história do Periquito e do Macaco”, assistimos às mudanças ocorridas na Rocinha após a instalação da Unidade de Polícia Pacificadora, a UPP. Situado em 2013, quando a maioria da classe média carioca ainda via a iniciativa do secretário de segurança José Beltrame como a panaceia contra todos os males, o conto mostra que, para a população sob o controle da polícia, o segundo “P” da sigla não era exatamente uma realidade. Em “Estação Padre Miguel”, cinco amigos se veem sob a mira dos fuzis dos traficantes locais. Nesses e nos outros contos, chama a atenção a capacidade narrativa do escritor, pintando com cores vivas personagens e ambientes sem nunca perder o suspense e o foco na ação. Na literatura brasileira contemporânea, que tantas vezes negligencia a trama em favor de supostas experimentações formais, O sol na cabeça surge como uma mais que bem-vinda novidade.


Autor: Geovani Martins
Editora: Companhia das Letras
Páginas: 120
Classificação: 3/5


Eu já tinha escutado falar do autor por alto em uma chamada do programa “Conversa com Bial” e logo me interessei devido a seguinte frase “Antes mesmo de ser lançado no Brasil, esse livro já foi vendido para X países”, um fenômeno de fato e isso despertou minha curiosidade para ler essa maravilha e tirar minhas próprias conclusões.

Sol na cabeça é um livro de contos, no total são treze e eles retratam a realidade de quem vive na favela. Particularmente eu não sou muito chegada em contos, pois falta história, eu fico sedenta por mais e isso aconteceu em apenas um conto do livro todo “Roleta–russa” eu fiquei doida quando acabou assim, sem resolução me deixando curiosa para saber sobre um desfecho que nunca chegará, porém as outras histórias fecham por completo sem necessidade de mais.

Divergindo da galera que já leu o livro e tem como seu preferido “Rolézim” eu prefiro “O mistério da vila” que fala de união, de abrir mão de diferença religiosa, de respeito e amor ao próximo, tudo pela visão de três crianças, mais uma prova de que intolerância não nasce com a gente, mas é adquirida e ensinada conforme formamos nossas opiniões sobre o mundo.

Geovani usa as palavras para dar voz a quem sempre viveu calado, nas páginas do livro é possível notar muita vivencia. Nascido e criado na favela, pobre e sem perspectiva de um futuro brilhante, ele usa sua bagagem para escrever algo que incomoda e faz pensar, duas características que fazem desse livro algo além de entretenimento.

O autor passeia entre a linguagem coloquial (gírias) e uma narrativa quase poética, ritmada e bem desenvolvida. O talento do Giovani é notório e ele soube aproveitar esse dom para falar de assuntos que estão esquecidos, mesmo que façam parte do nosso cotidiano, como: drogas, violência, tráfico, morte etc. Dá nome as favelas e para tanta gente sem rosto, é fácil perceber que seu grande sucesso vem da representatividade, do quase inexplorado Rio de Janeiro, daquele Rio que só aparece nos jornais na parte policial.

Confesso que de primeira eu pensei, “que isso?”, não esperava algo tão próximo à realidade e fiquei um pouco chocada, sendo assim corri no Youtube e assisti a entrevista com o Bial (aquela da chamada) para que fosse possível um melhor entendimento das histórias e para conhecer mais sobre o autor, curti a entrevista, achei a vida do Geovani bem interessante e adquiri respeito pela sua história.

Não vou chegar aqui e dizer que levei “de boa” o que o livro apresenta, sei que faz parte de uma realidade que está bem perto de mim, que por algumas vezes presenciei, mas não me peçam para dizer que eu apoio o estilo de vida que o autor apresenta, a linha traçada entre o certo e o errado vai muito de quem está lendo, se você é uma pessoa que acha “ok” o uso recreativo da maconha, por exemplo, não vai se incomodar, mas para mim que não defendo isso, que acredito que dessa forma apenas sustentamos um câncer que é a criminalidade foi bem difícil. Porém consegui me despir de julgamentos, li de mente aberta e me deixei guiar pelas palavras do autor que em nenhum momento diz se acha certo ou errado o que narra, é bem natural de seus personagens, como beber refrigerante, é uma questão de “onde e como” (onde vivemos e como somos criados) o livro narra uma realidade, eu goste dela ou não.

Foi uma leitura muito interessante, refleti sobre algumas questões e fico feliz de ter tido a oportunidade de viver essa experiência, fico feliz que muitas pessoas estejam abraçando o projeto e que a nossa realidade voe e leve conhecimento para o mundo a fora, pois conhecimento é poder, conhecimento é respeito. Sair da zona de conforto incomoda, é difícil, porém necessário e se cada dia mais, nem que seja por um minuto nos colocarmos no lugar do outro e trabalhar a empatia vamos construindo algo novo.

Leiam Sol na cabeça, não pela fama, mas pelo conhecimento de um mundo tão próximo e tão distante, de uma realidade que pode não ser a sua, mas é a realidade de muitos. Só leia e tirem suas conclusões assim como eu tirei as minhas.

Beijo e até a próxima!



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